domingo, 25 de maio de 2008

Um Nepal para pensar

Este post era para ser inteiramente dedicado ao Nepal, mas não temos como deixar de mencionar como foi a nossa ida pra lá, portanto novamente sobre ela, a China. Como ir para o Nepal por terra estava fora de cogitação devido à questão com o Tibet, pegar um avião de Chengdu para Kathmandu. era a única opção. Sinceramente quanto mais esforço fazemos menos entendemos como funciona a cabeça desse povo.

Ao final do processo de emigração e revista deixamos Chengdu achando que logo logo estaríamos em outro país. Para nossa surpresa depois de pouco tempo de vôo ouvimos que haveria uma parada em Lhasa, capital do Tibet. Pera aí, como assim? Ficamos sem saber o que pensar, mas o pior estava por vir. Todos desembarcaram e no desembarque todo o processo de emigração e revista de novo, daí nos transferiram para outro setor e novamente emigração e revista!????

Após preencher papelada, mostrar passaporte e sermos revistados por três vezes no total, contando com Chengdu, voltamos ao mesmo (isso mesmo, mesmo) avião que partimos para dessa vez sim seguir para Kathmandu. Se alguém entender qual o objetivo de tudo isso nos explique por favor porque nem nós nem ninguém do vôo conseguiu. A questão não era não entrar no Tibet? Então por que nos fazer descer em Lhasa e repetir exatamente a mesma coisa que já havia sido feita? Será que vamos ter que retroceder no tempo e usar novamente a expressão BIC? No final das contas não dá pra saber se foi bom ou se foi ruim sobrevoar Lhasa e ver as montanhas tibetanas de pertinho do aeroporto. Talvez só tenha deixado mais vontade de ficar por lá.

Para quem acha que uma vez no Nepal todo o problema com o Tibet estaria superado, muito engano. Chegamos a Kathmandu e fomos direto para Boudhanath, uma região predominantemente ocupada por refugiados tibetanos e com uma forte influência dessa cultura também. Essa é uma das áreas mais encantadoras da cidade.

No centro há uma grande estupa ao redor da qual todos andam sempre no mesmo sentido com a intenção de serem abençoados. Portanto não tente andar no sentido contrário mesmo que seja muito mais perto de onde você quer chegar. O percurso não é grande e faz parte entrar no clima. O entardecer é a melhor hora para passar por lá. Nesse momento o lugar fica lotado de pessoas, muitos monges, budistas em geral e até hinduístas que simpatizam com a filosofia do budismo. Todos andando em círculos ou realizando seus rituais.

Em Boudhanath também presenciamos um protesto para a libertação do Tibet. A gente já sabia que esse era o estilo dos protestos, mas foi emocionante ver um de perto. Nada de caras pintadas, faixas e tumulto. Eles somente se reúnem, rezam e cantam pedindo para que a situação melhore. É de sentir o coração apertado.

Ao redor da estupa há um dos principais centros comerciais de Kathmandu e é só dar uma caminhada por ali para ter uma idéia de como funciona a capital do Nepal. As duas coisas que mais chamam a atenção são a pobreza e a mistura de culturas. Sabíamos que o país era pobre e considerado de terceiro mundo, mas nem de longe imaginávamos que era tanto assim. Poucas ruas têm calçamento e se vê muito lixo por todos os cantos. O engraçado é que todo mundo fala inglês, é obrigatório para as crianças no colégio, então o vendedor de banana na rua, garçom, motorista, seja quem for, fala inglês tão bem quanto nepalês.

O hinduísmo e o budismo são muito fortes e se misturam no dia a dia da cidade. O hinduísmo pela proximidade com a Índia. Foi o nosso primeiro contato com as mulheres hindus e suas roupas super-coloridas e com as vacas sagradas revirando os lixos por toda parte. O budismo porque foi no Nepal que o Buda nasceu e segundo o budismo daqui, foi no monte Swayambunath que o mundo começou. Nesse monte há uma outra grande estupa e de lá é possível ter uma vista panorâmica de Kathmandu.

Quem já viu uma grande favela no Brasil pode ter uma idéia. Essa é a impressão de quem vê a cidade. Kathmandu parece uma favela gigante. Não há prédios grandes nem nada do que estamos acostumados a encontrar na capital de um país. Somente sobradinhos, casas e pequenos prédios, na maioria sem reboco se amontoando. Entre o monte e o centro da cidade há um rio que é a coisa mais suja que já vimos na vida. Toneladas de lixo e um fedor que dá medo, cheio de porcos, ratos e vacas tentando aproveitar alguma coisa. E não é na periferia, é na região central de Kathmandu.


Agora o centro mesmo é a área conhecida como Thamel. Um emaranhado de lojas de roupas, albergues, agências de turismo, rickshaws (táxi-bicicleta), crianças de rua e gente vendendo até a alma se for preciso. Tudo com o preço que se for pensar em dólar já é barato, mas que se pechinchar leva por muito menos.

Uma coisa é fato, cozinha de restaurante em geral é um moquifo, então é até melhor não ver. Banheiro é quase sempre muito porco, não importa onde se esteja, num boteco ou num prédio do governo. O mais importante é evitar os banheiros dos restaurantes porque entrar num lugar sujo, fedido, agachar pra fazer suas necessidades (quase não existe vaso sanitário na Ásia) num cômodo sem ralo e ver que depois tudo escorre para o mesmo lugar onde o cara está lavando os pratos agachado no chão, ninguém merece.

Tiramos um dia para conhecer Patan, considerada uma cidade vizinha, mas que na verdade está muito próxima a Kathmandu. Lá estão alguns dos prédios com a arquitetura mais bonita que já vimos, em especial em Durbar Square. Tudo se deteriorando, quase caindo aos pedaços. É uma pena, mas se as coisas continuarem assim nada vai durar muito tempo. Para completar, ainda tem um monte de gente morando no interior dos prédios históricos, vivendo numa porquice que com certeza colabora com a deterioração do lugar.

Nos arredores as ruas conseguem ser ainda mais sujas que todas as outras que já vimos. Dá vontade de sacudir as pessoas, dizer: Como vocês conseguem viver nessa imundice, que ainda por cima são vocês quem fazem? Daí dá vontade de tentar explicar que se eles não jogarem o lixo no chão muita coisa já vai melhorar. Mas não adianta, as pessoas não têm a noção de que o público também é seu e que cada um tem que colaborar. Estão acostumados há muito tempo a jogar no chão suas sobras para as vacas sagradas e depois que surgiu o plástico vai o plástico pro chão também, vai tudo na verdade. É angustiante essa situação. No Brasil existe a expressão eu sou pobre, mas eu sou limpinho, no Nepal não.

Mas o que de fato mais nos impressionou foi o dia em que acordamos cedinho para conhecer o Pashupatinath, principal templo hindu do país. Construido às magens do rio Bagmati, considerado o Ganges do Nepal. É lá que os hindus queimam seus mortos e realizam seus rituais para depois jogarem as cinzas na água. Chegamos meio perdidos, sem saber o que esperar e ficamos observando de canto. No outro lado do rio estavam acontecendo algumas cerimônias entre elas o que seria o funeral (ou como quer que eles chamem) de uma criança. Foi meio chocante ver aquelas cenas. Muita gente ao redor, a família inconsolável, a criança vestida com roupas muito bonitas, todos que chegavam depositavam sobre ela flores e dinheiro.

Bem próximo vários meninos de rua esperavam o momento em que o corpo seria enrolado em uma túnica e algumas notas caíssem para que eles pudessem pegar. Ao lado uma cremação com chamas fortes acontecendo, pessoas entrando no rio mesmo ele estando muito sujo com restos de oferendas e lixo em geral.
A gente ficou meio tonto com tudo aquilo e de repente começaram a surgir macacos por todos os lados, aos bandos, descendo as paredes dos templos, revirando tudo atrás de comida, dominando o lugar. Alguém que estivesse comendo alguma coisa teria seu lanche roubado, como vimos acontecer e nada de revidar porque apesar de pequenos os bichos são muito agressivos.

Nessa noite a gente quase não dormiu. Foram horas em claro revirando na cama tentando assimilar tanta coisa, tantas diferenças. Quando você está vivendo sua rotina na sua cidade o mundo parece tão grande, quando você sai e começa a desbravar vê que na verdade não é tão grande assim, ir daqui pra ali pode ser mais rápido e fácil do que se pensa.

Todos falam de globalização hoje em dia, mas o que ainda influencia o comportamento e o estilo de vida de muita gente é a religião. Religião e dinheiro aparentemente são o ponto de partida para uma noite de reflexão sobe o Nepal, sobre o mundo.

Sem dúvida o Nepal foi o lugar que até então mais nos chocou em nossa viagem. Conversamos com alguns amigos que fizemos aqui e que estavam voltando da Índia que é o nosso próximo destino. Todos foram unânimes em dizer que o Nepal é só uma pequena amostra do que está por vir. Um estágio antes de encarar a Índia ou umas férias para quem sai dela. Antes, no entanto não podemos deixar de conhecer o topo do mundo. É, já que estamos no Nepal não podemos deixar de ir à cordilheira do Himalaia. Mas essa a gente conta na seqüência. Nos encontramos nas alturas.

8 comentários:

António Rebordão disse...

Olá aos dois,

Gostei muito do vosso post sobre o Nepal e é um dos meus destinos prioritários para os próximos dois anos. Continuem a partilha e a viagem.

Entretanto discordo do vosso comentário de que "quase não existe vaso sanitário na Ásia". Penso que vocês usam uma concepção errada da Ásia (que é enorme) e mesmo se a reduzirmos ao SE Asiático, continua a ser não se aplicar a generalização. Mas há leitores que não sabem disso e acreditam naquilo que lhes é dito.

Cumprimentos,

Marfa disse...

vixi!
hehe!
saudade!

Anônimo disse...

Antonio, os vasos sanitarios de que estamos falando sao os do tipo acento, encontrado nas Americas. Pelo menos nos lugares em que fomos no Japao, China, Nepal e India a grande maioria 'e do tipo SQUAT onde voce tem que aproveitar o momento de cocoras.
Se for ao Nepal nao deixe de fazer o Annapurna Circuit ou o ABC...proximo post.
Arigato, Augusto

Anônimo disse...

Oi negrinha!!! Oi casal! Encantadora essa viagem d vcs, e tais situações nas quais sentimo-nos "incapazes", como no caso "educativo" do lixo d q comentaram, realmente são dignas muito mais d reflexão! Bem, queria compartilhar tbém c/ vcs, q de forma indireta, estão me cutucando! rsrs
Estou indo semana q vem p o Peru trabalhar como voluntária durante um mês e pouco...Aiaia! Espero "enriquecer" com as experiências futuras, um pouco, digamos assim, da "riqueza" q reina no coração e mente d vcs por esse mundo afora! Um super abração! Carinhosamente, Claudinha.

Anônimo disse...

e ae Tio Guto? Quem tá escrevendo é o Rafael do LPKN.

Tô curtindo demais seus posts, ótimos ensinamentos para uma futura viagem pessoal.

E que bom que sua viagem não é só de "curtição" mas uma viagem de reflexão sobre a vida atual.

Queria saber se estás pensando em passar por GOA quando for à Índia...

Keep Posting, Rafael

Anônimo disse...

Olha so' a rapazeada do LPkN por aqui!
Rafael, 'e inevitavel nao parar pra refletir sobre tanta coisa diferente que a gente anda vivendo.
Quanto 'a Goa, nao esta' no roteiro inicial, mas pode ser uma alternativa. Estamos deixando o roteiro da viagem bem flexivel para podermos conhecer alguns lugares que se apresentam interessante no meio do caminho.
Abraco pro pessoal dos treinos,
Augusto

Unknown disse...

HOLA AMIGO MIO
MUITO BONITO SUOS VIAJEM.
LES MANDO UN ABRAZO GIGANTE A OS 2. ESPERO SIGAN DISFRUTANDO MUITO.
RECUERDEN SIEMPRE QUE SON BIENVENIDOS EM CHILE.
OS VEMOS AHI EN JANEIRO

TOMAS (OS CHILENOS DO TREKING AO NEPAL)

Anônimo disse...

Oi Claudia!
Que legal que voce esta indo para o Peru!Alem de conhecer um lugar tao especial, colocar a mao na massa. Ano passado acabei fazendo bastante trabalho voluntario no Nordeste tamb'e, pode ser muito desgastante e cansativo, mas sempre vale a pena tentar. Bos sorte e um beijao. Ah e conta mais!!
Aline