terça-feira, 8 de julho de 2008

Tempestade no deserto

Quando começamos a planejar nossa viagem e decidimos incluir a Índia em nosso roteiro não sabíamos de muita coisa, apenas que queríamos fazer um safári de camelo pelo deserto de Thar. Ao chegarmos lá as pessoas começaram a nos assustar e dizer que essa não era a melhor hora pois a temperatura estava beirando os 50 graus. Decidimos ir mesmo assim, pelo menos para conhecer a cidade de Jaisalmer, que fica no meio do deserto. Loucos de medo de cozinhar no caminho, a final a gente não tinha nem idéia de como seria um calor desses.

Por sorte conseguimos pegar um trem e ter uma viagem tranqüila (com exceção do monte de areia que entrou pela janela e nos fez chegar iguais a uns croquetes). Naquela semana estava acontecendo um protesto de uma casta que queria descer na hierarquia para poder ter direto a cotas na universidade. Estavam bloqueando o transporte pelo Rajastão e atacando com pedras os que não respeitassem.

Jaisalmer, também chamada de Cidade Dourada, é uma cidade toda feita de rocha da mesma cor que a terra. Então é como se a cidade e o deserto fossem uma coisa só. Os saris e os turbantes são os mais coloridos que já vimos e o contraste de tantas cores com o tom pálido da areia cria uma atmosfera inacreditável.

Até hoje as pessoas vivem dentro do grande forte que fica sobre morro na região central da cidade. Andar pelas ruas de Jaisalmer em 2008 deve ser praticamente igual a centenas de anos atrás. A não ser pela presença de alguns veículos e internet, tudo parece permanecer como sempre foi.

Nas pousadas eles tentam vender os safáris pelo triplo do preço, a gente não embarcou e saímos para procurar uma opção para o nosso bolso. Escolhemos a Sahara Travels que era recomendada pelo guia, a final, a gente ia se meter no meio do deserto e não podia ser com qualquer um.

Chegamos lá e fomos atendidos por um rosto familiar. O mesmo rosto que estava espalhado em diversas propagandas pela cidade só que uns 20 anos mais velho. Mr. Desert é o nome da figura. Com uma voz serena, muito carisma e olhos verdes no meio de tanta barba, turbante e bigode ele nos conquistou.
Foi a primeira vez que ficamos num quarto com TV, cada um pagou o equivalente a 2 reais pela diária, no início da noite faltou luz e não teve como dormir sem ventilador e ar condicionado. Passamos a noite no terraço como fazem as pessoas locais e mesmo assim o calor estava danado, essa história de que no deserto esfria a noite não se aplica por aqui.

O dia do esperado safári chegou e partimos para iniciar nossa jornada pelo Deserto de Thar. Eram três guias, um inglês, uma francesa e nós, a temperatura não chegava a cinqüenta, mas estava perto dos 45 graus, que calor!!! Nos embrenhamos mesmo, de vez em quando a gente passava por algum vilarejo e nossas refeições eram todas feitas em acampamentos que os guias montavam.

Mesmo com pouca infra-estrutura o chapati (pão típico da índia) e o curry de cada dia não faltaram. O percurso foi longo, perto do final da tarde paramos nos huts de uma família que mora no meio de um mar de areia, longe de tudo. Nos receberam com um chai (chá apimentado com leite, que todo mundo toma toda hora, inclusive a gente). Ficamos ali conversando sobre o estilo dessa gente que opta por uma vida cigana e se isola do resto do mundo.


A tardinha chegamos próximo à região que seria nosso acampamento e enquanto tirávamos fotos de um dos pores do sol mais bonitos que já vimos escutamos o chamado dos guias dizendo para voltarmos rapidamente para nossa base. Não sabíamos o que estava acontecendo, mas foi só olhar o lado para começar a entender.


Uma tempestade de areia gigante, como nunca antes vista vinha na nossa direção. Ficamos assustados, mas eles disseram que isso acontece as vezes, dura cerca de uma hora e vai embora. Ficamos ali vendo ela chegar, o vento começou a apertar e a areia a bater com mais força.

No início a gente estava até achando legal porque uma noite que deveria ser dormida ao relento olhando as estrelas estava mais emocionante. Só que a tempestade não quis saber de passar e tivemos que no abrigar dentro dos huts cheios de entulho e morcegos. Acho que esperamos umas 3 horas até o vento começar a diminuir. Os guias então levaram as caminhas para o ar livre e lá fomos nós.

Acho que não demorou 5 minutos para todo mundo pegar no sono, mas eu (Aline) não preguei o olho. Vi tudo acontecer. Aos poucos a velocidade do vento começou a aumentar, rajadas de areia muito fortes, pingos de chuva (sim, acreditem chuva no deserto) e o ápice quando as cobertas e travesseiros começaram a voar. Me apavorei, só que toda essa seqüência se instalou muito rápido, em cerca de 10 segundos, foi só o tempo de eu realizar o que estava acontecendo e chamar o Preto.

Os outros também acordaram, todo mundo apavorado, até os guias. Não dava pra enxergar nada e o vento só aumentava. Todo mundo deu as mãos, pegamos nossas mochilas e deixamos o resto para trás (tudo que não tinha voado ainda). Caminhamos em direção aos huts e nos abrigamos. Entrei lá e comecei a tremer de medo. Sério, foi a primeira vez que isso aconteceu em toda minha vida, nunca havia tremido de medo antes. Enquanto todo mundo parecia estar mais tranqüilo eu só pensava comigo mesma “se isso for um ciclone mesmo, desses asiáticos que passam levando tudo a gente tá perdido”.

Esses hutsinhos sem alicerces e nada são a mesma coisa. E continuava tremendo, e lembrava do ciclone que matou milhares de pessoas um mês antes em Mianmar, vizinha da Índia. Quando o dia amanheceu e o vento acalmou agradeci por estar viva.

O segundo dia foi mais tranqüilo, chegamos bem próximo da fronteira com o Paquistão e retornamos a Jaisalmer. Croquetes literalmente, todos suados com areia por todos os cantos. Bem a tempo de pegar nosso trem para Jodhpur. Ou seja, a noite mais melada e áspera de toda nossa vida. Mas se sobrevivemos à noite anterior, sobrevivemos à essa também.

5 comentários:

Leonardo Rios disse...

bah...que loucura! Tá cada vez mais roots esses lugares que vocês vão!! E que espetáculo é essa India!

Anônimo disse...

Oie, que loucura essa tempestade de areia!!Please cuidem-se, saudades!!! Beijos!!Camila e beta!!

Anônimo disse...

Alineee!!
Continuo sempre acompanhando vocÊs, e cada vez mais encantada com as históriass e as fotoss!! (aquela do por-do-sol tá um espetáculo; sem contar a fofura das fotos com os camêlos, hehe)!!

Continuem aproveitando muuitoo aí e nos fazendo viajar junto com vocês!!!

Bjão

Renata Freire

Mari Mendoza disse...

Genteee, lendo o post fiquei até com medo, tentando imaginar como deve ter sido essa noite no deserto! Mas que bom que vocês estão bem e continuam a aventura! As fotos estão maravilhosas!! Apesar desses momentos de tensão, dá pra perceber a cara de feliz de vocês!! Aline, a tua foto com o camelo tá uma GRAÇA! hehehehe! Um beijão!!

Anônimo disse...

Ei pessoal, continuem nos acompanhando, valeu!!!!!!!!!