segunda-feira, 9 de junho de 2008

Chegamos na Índia

É difícil encontrar alguém que seja indiferente em relação à Índia, geralmente as pessoas que passam por aqui ou amam ou odeiam, mas o consenso é que é uma experiência muito intensa. Durante muito tempo escutamos várias histórias e de certa forma tentamos nos preparar para esse momento.

Enquanto o Preto diz que estava esperando o pior (gente cagando no meio da rua, esgoto em todos os lugares, montes e montes de sujeira por todos os lados, um verdadeiro lixão), eu (Aline) tentei não me influenciar e por causa disso acabei me chocando mais.
Na verdade algumas pessoas nos perguntaram se essa etapa da viagem (desde a China) estava valendo a pena, devido a algumas coisas que descrevemos. A resposta é claro que sim, porque desde o início o objetivo da nossa viagem de volta ao mundo era justamente ver o mundo como ele realmente é, todas as suas diferenças e contrastes incluindo coisas que podem não agradar a todos os gostos.

Para algumas pessoas pode não ser o ideal, quem está procurando sofisticação, organização e limpeza definitivamente deve optar por outro roteiro. Aqui no blog tentamos descrever o mais fielmente possível nossas experiências pessoais, como estamos encarando tanta diversidade. É claro que são somente dois pontos de vista sobre um mundo que estamos recém começando a descobrir. Têm coisas que em algumas situações seria melhor abstrair, mas que se assim o fizéssemos estaríamos camuflando a realidade. Por isso demos ênfase a alguns hábitos e situações que de certa forma foram marcantes por serem inusitadas para nós. Imagina qual seria a reação de um nepalês do Himalaia num baile funk carioca?

Avisaram-nos que entrar na Índia por Gorakhpur poderia ser assustador e estigmatizar o resto do país, mas não tínhamos muitas outras opções visto que estávamos deixando o Nepal por terra e nosso destino era Varanasi. O trajeto foi difícil, primeiro 12 horas sentados num ônibus noturno quase sem se mexer até a fronteira, seguido de uma lotação até Gorakhpur onde finalmente pegaríamos outro ônibus. Imundos de poeira, famintos e loucos de calor atravessamos a pé a cidade com nossas mochilas nas costas até a rodoviária. Foi o suficiente para sentir na pele pela primeira vez como é estar na Índia.

Ser perseguidos por rickshaws que não se cansam de tentar uma corrida. Andar em alguns lugares dá a impressão de ter um tapete de lixo polvilhado com cocô de vaca sob os pés. O cheiro de esgoto se mistura com o de comida e temperos dos restaurantes que não tivemos coragem de entrar. Acabamos encarando umas samossas (massa frita com recheio de curry de batata), pois o ônibus estava prestes a sair.


No ônibus uma situação que podemos chamar de bizarra. Uma nova modalidade de buzina que ainda não conhecíamos, a buzina contínua. O motorista simplesmente atolava a mão na buzina e não tirava mais. Primeiro ficamos rindo e achando aquilo surreal, mas quase seis horas de buzina na cabeça não dá pra agüentar, pedimos pro cara aliviar, mas ele pareceu não entender, e todo mundo achando aquilo normal. Sério, é de enlouquecer um cidadão.
Após uma jornada de quase 24 horas chegamos a famosa Varanasi, cidade sagrada para os hinduístas, onde passa o Rio Ganges que é sede de vários rituais.

Para tentar entender o que se passa por lá é necessário saber um pouquinho mais do hinduísmo. Resumindo: essa religião é uma das principais da Índia, basicamente acredita em Deus e em reencarnação. Deus é chamado Brahman e tem três principais formas de ser representado. Brahma que é o responsável pela criação e teve seu principal papel na criação do mundo, Vishnu que é o responsável pela preservação e teve diversas reencarnações entre elas Krishna e Buda, e finalmente Shiva (que possui diversos nomes) que é o responsável pela destruição.

Destruição não em um mau sentido e sim como um fim para que as coisas recomecem e o universo siga seu ciclo. Varanasi é a cidade de Shiva, portanto é onde as coisas terminam. A cidade se localiza às margens do Ganges e tem diversos Ghats (escadarias que levam ao rio e onde são realizados os rituais), dois dos quais são destinados a cremação de corpos. Para cá vêm corpos de todo o país para que sejam cremados e jogados no rio sagrado.

Se fosse só isso tudo bem, acontece que nem todos os corpos são cremados. Crianças com menos de 12 anos, mulheres grávidas, pessoas com hanseníase, picadas de cobra, sadhus (homens que abdicam dos bens materiais para viver orando) e alguns animais são jogados diretamente no rio.

Para lá também escorre todo o esgoto da cidade. É no rio que as vacas sagradas e as pessoas se banham e fazem escolinha de natação. Nos nossos primeiros dias em Varanasi fizemos um passeio de barco pelo rio ao amanhecer e vimos tudo isso.

Olhávamos e quase não falávamos entre nós, concentrados no que nossos olhos captavam. Um pensamento que não saia da cabeça era: isso está realmente acontecendo? Isso é verdade? O ápice foi quando ao olhar pro lado demos de cara com um corpo humano flutuando, a não mais que 20 metros de onde as pessoas estavam se divertindo nadando no rio, indiferentes à aquilo que para nós era quase inacreditável.

Todas as noites é realizada uma cerimônia muito bonita na beira do rio. Música tradicional e coreografias com fogo, dá pra relaxar por alguns minutos, até a hora de voltar pra casa. Hora que todo mundo resolve voltar junto pela mesma rua da cidade, a rua do comércio de sedas e onde todos os rickshaws estão aguardando ansiosos.

Na Índia as mulheres são chamadas de madam (madame) e os homens de Sr. A cada passo alguém te aborda, tem uns que grudam e não te deixam mais em paz. Homens e mulheres são requisitados de formas diferentes, mas basicamente assim: Hello madam, você quer seda, você quer sari? Pra onde vai, quer rickshaw? O que você quer? Entra aqui e dá uma olhada. Entra, entra!!!

Para os homens é semelhante só que substitui a parte dos tecidos por drogas. Oferecem todo tipo de droga que se possa imaginar. Assim no meio da muvuca, na rua. Depois dessa noite pensei em fazer uma camiseta com letras bem grandes escrito não quero sedas, não quero sari, Não quero rickshaw, não quero drogas, não tenho dinheiro. Pra quê? No outro dia saí na rua e vi uma camiseta pra vender com a mesma coisa escrita. Pelo visto não fui a primeira nem a única a ter essa idéia.

Mas Varanasi tem outras peculiaridades que a deixam ainda mais especial. Em que outro lugar do mundo alguém esperaria encontrar uma vaca, ainda por cima desse tamanho, dentro de uma loja? Assim descansando, olhando o movimento? E ir ao dentista no meio da rua? Vishhhhhh, têm vários. A pessoa agacha e arruma os dentes ali mesmo. Pegar um suco de frutas como romã ou lichia e ir passear no mercado de flores, cercado de tantas cores e perfumes, prestando atenção na fisionomia de cada um. Sair com a máquina fotográfica na mão também pode render várias risadas, uma vez que o pessoal fica pedindo por um clique e adoram posar para fotos.




É difícil descrever com palavras e de uma forma tão rápida nossa experiência em Varanasi. Foram muitas emoções para os três dias em que estivemos lá. Um bom início para esse um mês de Índia que temos pela frente. Seguimos tentando descobrir se nos outros lugares que nos aguardam existem regras, organização ou alguma coisa parecida e que não encontramos aqui. O mais próximo da palavra CAOS que já experimentamos.

11 comentários:

Unknown disse...

CARAMBAAAAAAAA!!!!! E eu nem imaginava que tudo isso realmente acontecia. Quero dizer, imaginava sim (mas não acreditava muito). Que isso...Beijão pra vocês!! Já to louca pra "conhecer" o resto da Índia. hehe. Saudade...

Maio disse...

caramba negao!!! tuas foto tao foda! contando os dia pra vossa aparicao aqui :D Abraco saudades

Leonardo Rios disse...

E aí Aline! Sensacional o teu texto, deu para sentir realmente o que é esse país! Eu já estou com idéia de ir a India, depois de ler o que tu escreveu, vou ter que ir na primeira oportunidade!!
Ah...em Bangkok também tem umas camisetas dizendo: "I don't a fucking masssage or a fucking tuk tuk....." O pessoal encomoda muito na rua!
Boa sorte para você e aproveitem muuito....isso não tem preço! Capricha nas fotos! beijão!

Unknown disse...

Puuuuuuuuuuxa... a India é uma mistura mesmo, ja ouvi várias coisas, mas sempre me surpreendo!!!

Bom, tem uma amiga (Rafaela) e a sua mãe moram ja a dois anos em Delhi. O e-mail dela é rafa-paz-amor@hotmail.com e o número do celular é 987.318.4392.

Bjos e tudo de bom!
Milinha

Anônimo disse...

Iriririri. Vish meu povo, e olha que a coisa esta so comecando...mas o negocio nao e mole nao. Estamos com muitas saudades, Beijos Lua, Leo, Diego, Camila e Eduardo.

Anônimo disse...

No comeco a gente so tomava agua mineral (vai saber a qualidade) mas depois do primeiro piriri a gente deu uma desencanada. Nao tem como regular tanto e depois 'e so tomar o remedinho.
Abracao,
Augusto

.Kel. disse...

Maravilhosa a descrição, parabéns pelo blog...

Anônimo disse...

Genteeeeeee sempre falei q queria conhecer a India e o Pato sempre me disse: eu não!! Exatamente por isso que vcs descreveram, que eu não acreditava hehehehehe Que coisa esse rio hein, bahhhhhhhh que coisa isso tudo heheheheh Acho q essa eu não ia encarar...Só aqui através do blog, que está muuuuuito interessante!! bj bj sigo acompanhando!!

Anônimo disse...

que coisa! lendo tudo o q escreveram fico imaginando q para jogar defunto no rio Ganges não precisa mt critério... aliás, pelo jeito, "apagar" qq neguinho e jogar no rio parece ser mole... que dureza!!!
Aline, estou impressionada como vc escreve bem, tem uma linguagem narrativa perfeita e mt didática...estou adorando ler voces. Beijos Dede

Anônimo disse...

Ei obrigada pelos elogios galera!!!!!!!!!!!Fico muito feliz em poder exercitar esse lado e escrever alguma coisa que não sejam receias!!Hehe, continuem acompanhando que essa Índia ainda vai render!!

bia disse...

nossa ...sinceramente fiquei chocada e sem palavras...depois de uma descrição assim...
até parece que eu já fui lá ...
show de bola continue assim